Demorou, mas lá acabei Damned to Fame, a biografia de Samuel Beckett. James Knowlson conheceu-o, foi sondado em 1972 para lhe escrever a biografia, mas por Beckett não o querer a ele (queria que perdurasse o trabalho e não a vida pessoal), rejeitou. Mais tarde, já que alguém ia acabar por escrevê-la, chamou-o. Beckett deu-lhe acesso a tudo, concedeu entrevistas semanais, mas pediu que fosse publicado postumamente. Seis meses depois, morreu.
São quase 900 páginas, muito bem escritas e sem tomar partidos ou uma atitude populista, até porque com a vida de Beckett, não havia lugar para esses desvarios. Em termos culturais, já o disse aqui que para mim existe Beckett, e depois vêm os outros. A liberdade e as convicções anti-raciais e contra as injustiças foram características que o Irlandês desenvolveu pelas situações em que esteve. Das pessoas a locais, Knowlson mostra de onde surgem as personagens e o que elas significavam na obra.
A honra, integridade e educação eram importantes para Beckett, e com a ida para Paris para ensinar, começa a beber e aumentam os contactos com o meio artístico. O início prometedor como professor depressa deu lugar a doenças físicas e mentais que o perturbaram, e os anos seguintes com tantas viagens e regressos a casa são fascinantes. Com as dificuldades de guerra e as doenças e mortes na família, encontrou no teatro a ocupação da vida, com inúmeras viagens para auxiliar na produção das peças por todo o mundo.
É curioso ver que as obras literárias de maior expressão foram escritas no pós-guerra, em poucos anos e após grandes pausas e dificuldades. O resto da vida, foi reservado para as difíceis traduções, muitas por ele próprio. Teve os seus leitores, as suas amizades e amores, e há dois episódios que definem o maior génio do século XX. Ao vencer o Nobel da Literatura, ofereceu o dinheiro a amigos e colaboradores necessitados e fugiu para Tânger e Cascais. E quando foi enterrado, no dia a seguir ao Natal, sem que muita gente soubesse, até pela inconveniência da data, estava apenas rodeado pelos mais próximos, com o mundo aos pés dele, numa herança que há-de perdurar.
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