Na visão do autor de Jerusalém - A Biografia, esta cidade encontra-se no centro do que é o mundo, pois tudo o que se passou lá terá dito ou reflexo no mundo, ou os acontecimentos exteriores terão sido sempre transportados até esta cidade do Médio Oriente. Escrito de maneira neutra (apesar dos apelidos de Simon Sebag Montefiore concederem a precedência deste), é um livro realmente espantoso, que trata a história da cidade desde há três mil anos, do abandono, a opulência, as reconstruções, a destruição, os actos de bondade e as reviravoltas do destino que sempre se sucederam em Jerusalém. As três religiões monoteístas que dominaram os destinos da cidade servem de encaixe para as descrições das mudanças ao longo dos séculos, alicerçadas por uma escrita descomplexada, com um grande trabalho de pesquisa por trás e acessível. Apesar da sua extensão (e se o número de páginas pode assustar, o tamanho da letra diminuto permite que se inclua ainda mais informação), é um livro empolgante e cujo caminhar em direcção à era moderna se faz com a ansiedade dos grandes romances. A mística e os tesouros da cidade são compreendidos por Simon Sebag Montefiore, e dificilmente será escrito um livro melhor sobre esta cidade que tantas alegrias e desgraças trouxe ao mundo.
Uma versão comercial de um trabalho mais completo designado para os meios académicos, Tempo da Música, Música do Tempo foi um livro que saiu após a recepção do Prémio Pessoa por Eduardo Lourenço. Os textos inéditos aparecem divididos por períodos como o Francês e o Coimbrão, sendo muito diferentes na dimensão, e a opção de os publicar na língua em que foram escritos só contribui para a desorganização deste volume organizado por Barbara Aniello. Os 212 excertos surgiram em cadernos que este mantém e páginas soltas, cobrindo os anos de 1948 até 2006. Sobre o conteúdo, tal como o nome indica, a música (clássica), resta apenas acrescentar que, se algumas análises, observações e críticas são interessantes, à falta de um fio condutor e o carácter (excessivamente) pessoal dessas ideias, tornam o livro algo leviano. Talvez com a versão definitiva se fique com a certeza que Eduardo Lourenço tem realmente algo a dizer sobre música.
Pintura Habitada é um documentário de Joana Ascensão sobre a artista plástica Helena Almeida, com o título retirado de uma das suas séries. É um filme decente, não tanto sobre o percurso da artista, mas uma representação do trabalho de Helena Almeida, uma das mais célebres artistas Portuguesas, que faz uso do corpo e da fotografia na maioria dos trabalhos. Para além de exposições, estudos, desenhos e obras por imprimir, é possível assistir a algumas interações com colaboradores, e a fazes da criação onde a Lisboeta lida com a fronteira do espaço intimo e físico que a rodeia. A assistir, mas para pensar também, pois não é uma obra 'totalizada', ainda que muito própria.
Com uma fotografia magnífica, Hobo With a Shotgun tem, tal como o nome indica, um sem-abrigo como personagem principal. Com um começo que cola qualquer um à cadeira, o sem-abrigo assiste ao caos do mundo e a degradação das pessoas que habitam as ruas da cidade, tentando repor a ordem, mas dois jovens têm a policia no bolso. Ele é apanhado numa cilada, apunhalado e atirado para a rua. Uma prostituta ajuda-o e ele usa o gesto como combustível para a sua nova missão. Regressa aos mesmos sítios sem uma atitude de vingança e a tentar sobreviver, mas calha estar numa loja aquando esta é assaltada, e aniquila os assaltantes com uma caçadeira que passa a trazer. Começa a fazer justiça pelas próprias mãos em tudo o que vê, num filme que tem tanto de divertido como de violento, sendo uma boa sequência com Dead Snow.
Um filme sobre aceitação como Lars and The Real Girl consegue fazer essa aceitação bastante difícil. Os desempenhos dos actores, com Ryan Gosling à cabeça são competentes, mas não é que o plástico alguma vez desapareça da boneca que Lars encomenda alguma vez desapareça. Lars vive numa garagem e tem dificuldades em relacionar-se, e um colegaencontra online uma boneca anatomicamente correcta, que Lars decide testar. E depois apresentá-la aos amigos. E depois viver com ela, e jantar, convencido que ela é uma pessoa. A preocupação das pessoas que o rodeiam é reconduzida para um sentimento de aceitação da boneca, sem chegar a lado nenhum. Ela adoece e a mãe de Lars tenta convencer o casal mais próximo de que ela está mesmo doente. Ela morre e ele fica triste, como seria previsível.
Escrito e realizado por George Clooney, The Ides of March tem como personagem central o ajudante de um político, Ryan Gosling, que ao testar o primeiro discurso que o candidato Clooney usará no dia seguinte, não se apercebe que a sua visão moral da política vai ser confrontada com a realidade, e tomar controlo de tudo o que ele faz. Satisfatório pela política da política e preparação de um candidato em campo, mas a vida pessoal do ajudante da campanha e tudo o resto fazem deste um filme pouco memorável.
O que eu queria mesmo dizer, eram as palavras da Joana:
Mas que bela tarde! Foram, impossivelmente, os 140 minutos mais bem passados da minha vida. No decorrer das repetições dos dias que começam e acabam e começam e acabam da mesma maneira, fui invadida por um vasto manancial de emoções, da sonolência à raiva. Reconheço beleza neste Cavalo de Turim, mas o que eu vi foi uma sequência de fotografias a preto e branco. E voltei a vê-las. E baralha, distribuí e sai o mesmo jogo ainda assim. É uma repetição. Mas são bonitas as fotografias.
Sei que pode não ser uma opinião agradável de acordo com as normas do bom gosto e do bem falar, e compreendo que o sustento da história seja o poder do homem sobre a natureza, que findos os sete dias, se vê não ser nenhum, mas que paciência que é preciso! Isso, e coragem para ver este filme, e eu, tal como o outro, (sobre)vivi para contá-la. E comi pipocas durante a sessão.
Bem espremido eram cinco minutos de um filme qualquer, e podia-se resumir que era um dia de vento em que um cavalo não queria trabalhar. Mas foi mais, e dei por mim a fazer apostas cá com os meus botões, ao lado em que o cabelo da filha ia cair com o vento. Para ver pessoas a descascar batatas ajudava a minha mãe com a ceia de Natal! Há um plano longo em que decidem abandonar a casa e caminhar pelo monte acima, para lá da árvore, mas abandonam a ideia e regressam a casa pelo mesmo caminho. Disseram-me ser uma cena bonita, e eu suponho que sim, que adormeci e só os vi a regressar. A rever em dias cinzentos de sonolência.
Mas vou antes dizer isto:
 O esmagador peso do céu, último resguardo de todos os que estão abaixo de um Deus desconhecido, proporciona um ambiente hostil para receber o espectador, não obstante o deleite visual que é este filme-monumento, obra equidestante da luz e da escuridão. O canto do cisne em húngaro de Béla Tarr, um realizador que não engana ninguém, pois é garantido o conteúdo e a forma da sua criação, é uma janela semicerrada à esperança, um profundo estado depressivo mas resignado do apocalipse com que as personagens coabitam e cujo aprofundamento e imersão total se avizinha.
 O único ano mencionado é o de 1889, aquando a repescagem de Nietzsche para uma alegoria que envolve um cavalo. Esse cavalo, que desistiu mais cedo do que todos, compõe uma família, dê por onde der, com um pai e uma filha, que não se relacionam, apesar de ocuparem o mesmo espaço físico durante os rotineiros dias que dura a sequência. O fim dos dias aproxima-se, e a ideologia que seguiram em tempos, deixou-os sozinhos e isolados, com um poço que há-de secar, e um cavalo que há-de morrer, destino que os perseguirá na escuridão que se vai abater. A violência do vento cortante em espiral, enrodilhado com o sussurrar viperino, perspectivam as sombras que se abatem sobre este ermo que serve de morada à infortuna família desregulada. A compreensão que a filha tem em relação ao cavalo não é espelhada na sua relação com o pai, de presença altiva, como manda a tradição. Mas eles reencontram-se, por turnos, diante da janela da casa. E assusta não haver um resguardo para nos proteger do apagão final, essa imensa eternidade que se vai abater sobre o casebre do filme, e o resto do mundo. Mas a história desta família é também a da humanidade? Ou é uma charada sem significado? Estará a chave na natureza premonitória da raça cigana, que se recusa a construir telhados?
 A partida dos três personagens, influenciada pelo agravamento do clima, tem como eco o retorno imediato. A câmara, estanque, sabe que a família vai voltar. O destino estava traçado há muito, e não podem fugir dele. As pessoas são frágeis e esfarelam-se tal como as batatas cozidas que a família ingere todos os dias sem excepção. O pai diz pouco e recebe uns favores da filha. O pai é também o outro pai da civilização ocidental, é Deus, calado, ausente, incapaz. Tudo o que há para dizer, é dito em segundos. A força que é preciso para todas as tarefas no meio rural, está em falta.
 Para além do silêncio interpelado pelo vento assombroso, que deixa a narrativa sem resposta, sobressai a inesquecível, termo empregue após deliberação, fotografia. O plano-sequência com a bengala da música circular e hipnotizante (Mihály Víg). As inúmeras referências estéticas retiradas de séculos de pintura, que compõe tanto os planos mais memoráveis do filme, como aqueles que se perdem pela sua aparente (e falsa) vulgaridade, são um manancial por explorar, embutido nos cenários construídos para a ocasião. O tempo despendido a cada plano é recompensado pelos actores. Cada ruga do pai fica marcada no espectador, cada músculo do cavalo, cada fio de cabelo da filha.
 Agora, o cinema de Tarr apagou-se. Mas as sementes que deixa, hão-de ver a luz do dia. Quanto a este filme, não há dúvidas, foi o fim. Não sobra luz e as pedras só terra têm de companhia, para sempre.
Publicado como acompanhamento à exposição retrospectiva, Photography de Richard Prince é um fantástico livro de fotografia. Prince, que divide bastante as águas, tornou-se famoso pela apropriação ou roubo de imagens e ícons. Figura de proa de uma arte que rouba em vez de referenciar, e com toda a legitimidade. No seu limite, pode-se dizer que as fotografias mais famosas de Prince, são fotografias de outras fotografias, o que suscita discussões bastante acesas. O seu estilo percorre todo o imaginário Americano, desde os cowboys à cultura das motas de estrada, até à influência da publicidade e a reinterpretação da propaganda disassociada dos productos. Contém uma grande variedade de séries e serve como barómetro pessoal de cada um relativamente a Prince, pois estão aqui todos os trabalhos mais famosos.
De uma geração já estabelecida, Wolfgang Tillmans é um valor seguro da fotografia, e esta monografia editada pela Phaidon assim o comprova, com uma excelente apresentação. O estilo de Tillmans tem como principais temas a juventude e a rua, e é notória uma evolução que acompanha a expansão, dos retratos à paisagística. Vários períodos e acompanhado por entrevistas e recensões.
Fazendo uso de deformações nas pessoas, numa linhagem que cruza Botero com Muñoz, The Artist Who Swalloed The World foi uma exposição itinerante de Erwin Wurm, em que as pessoas ganham um traço desconcertante, partindo do princípio da maximização, onde carros, casas e pessoas são aumentadas. A força das imagens funciona até no papel e o tom crítico não sai descuidado no festival de cores vivas que Wurm usa. A monografia contém muitos trabalhos inéditos em diversos campos e é uma boa introdução ao Austríaco.
Ao longo de mais de duzentas páginas, Travelling 70-76 serve um período intermédio da vida do artista Americano Robert Rauschenberg, após a predominância dos materiais não convencionais combinados com a pintura, dando-lhe formas esculturais. Neste caso, a abstração mantém-se usando caixas de cartão. É curioso mas nada de espectacular.
Publicado pela Fundação Cupertino Miranda em conjunto com uma empresa de construção cívil, Cruzeiro Seixas é uma monografia dedicada ao surrealista Português. Simples e concisa, com vários exemplos dos desenhos, pinturas e escultura, serve o propósito de promover a obra do artista condignamente.
Parte de uma exposição na Holanda em 1996, Fuga Futuri de Alex Vermeulen contém uma série de experimentações visuais em variados suportes como fotografia, escultura, instalações ou performances, acerca do tempo. Uma cidade imaginária debaixo do gelo é o ambiente onde se dá uma epidemia que permite aos habitantes comunicarem telepaticamente. O trabalho é algo desafiante e curioso.