Andrei Tarkovsky morreu aos 54 anos, exilado em Paris, com um cancro, tendo realizado apenas sete filmes, sendo
O Sacrifício o ultimo, rodado na Suécia.
Intemporal, é uma viagem pela alma, entrando e saindo de cada personagem, como se o espectador estivesse munido de uma lanterna, para olhar para onde bem lhe apetecer.
A primeira cena, a água e a montanha, o passado e futuro lado a lado, análise e moral, o longe e o perto num plano soberbo com pai e filho a encontrarem-se.
Esteticamente soberba, a paz, as deambulações são traçadas de uma genialidade incomum, um conjunto de monólogos e constatações, que vão do introspectivo à posição desajustada que cada um ocupa na sociedade. A filosofia e Nietzsche marcam presença, voltando na voz do rapaz, no final do filme.
O falador e o cúmplice, ouvindo-o, de cuja face só se tem conhecimento, quando o tema é a morte. Da afecção passa para o sangue, do verde do campo para o preto e branco citadino. Alexander projecta no seu filho o medo que sente pela falta de espiritualidade do mundo. O antigo actor, professor e filósofo, agora na reforma, vê-se aturdido com a alteração no seu modo de viver.
Aos 27 minutos existe uma disposição das personagens em cena genial, com três graus de profundidade e um quarto, alheio ao assunto, escondido. Acaba com os dois homens sentados a falar do futuro. Nas mulheres, vemos-lhes a cara, no momento em que aparecem em cena, nos homens só depois de os ouvir discursar, distantes da câmera.
O cair, rastejar e levantar-se sozinho acaba por ser um resumo do filme, ainda que o final seja a inconsequência de prolongar esse movimento. Explora-se a relação entre o carteiro Otto e o reformado Alexander, sendo na verdade o confronto dos passados de ambos, e não o que eles são no presente.
A partir do climax envolvente da sala onde a familia toma conhecimento da guerra, o filme perde parte da magia, apenas iluminado por belos planos, as luzes amarelas entrelaçadas naqueles a preto e branco, até Alexander queimar a casa. O final simbólico do rapaz, que prevalece a tudo, plantando e cuidando do futuro é belíssimo.