A gigantesca análise das Case Study Houses desde 1945-66 tem uma meritória edição neste livro. Incluídas estão as 29 casas de Los Angeles de baixo custo que compuseram o programa da revista Arts & Architecture, ao longo de quase 500 páginas com desenhos e planos. O experimentalismo pós-guerra, de uma modernidade tão idílica, é notável, bem como a influência das casas, de arquitectos tão distintos como Neutra, os irmãos Eames, Saarinen ou Koenig. Imprescindível para quem gosta de arquitectura.

O Hipopótamo de Deus e Outros Textos é uma colecção de pequenas crónicas de José Tolentino Mendonça, com o subtítulo cristianismo e cultura, publicadas inicialmente em jornais e na internet. A temática gira em redor de como a igreja reage aos paradigmas do mundo moderno, ou seja, conteúdo teológico, não se esgotanto os textos nas palavras, oferecendo material digno de ponderação, com uma escrita sensata. Tolentino Mendonça demonstra uma grande abertura de espírito e falta de medo ao apontar os erros à sua igreja, sendo este o trabalho de um homem profundamente culto, que vale a pena ser lido por todos.

A análise do homem e da história da condição humana de E. M. Cioran tem o curioso título de Silogismos da Amargura. Tem tanto de moralista como de profano, tanto de genial como de insano. Muitas considerações aleatórias que são provocantes, mas que fazem o leitor pensar se não haverá ali verdade. Recomendável.

Uma revisitação da carreira de Blek le Rat, Getting Through The Walls é muito completa, dado tratar-se de street art, território dado a uma temporalidade específica. Não sendo um apreciador do estilo dele, a dedicação às ruas e a maneira como ajudou a cimentar a estética de stencils a preto e branco, e autocolantes, merece respeito. Muitas imagens e sempre com explicações do artista.

Cinco diálogos estimulantes sobre o bem e o mal e o destino, constituem Diálogos dos Mortos, uma série de textos fictícios, escritos por François Fénelon para o neto de Luis XIV aprender algumas noções como a bondade, e formas de reger o reino, numa escrita curiosa.

Como o nome indica, A Biblioteca Particular de Fernando Pessoa é uma colheita das capas dos próprios exemplares que o escritor tinha, muitas vezes com anotações. Os 1311 títulos cingem-se aos anos 1898-1935, reunidos numa bela edição, sendo quase todos em Francês, Português e principalmente, Inglês, de onde ele encomendava livros. Muitos deles são em Português, sendo as ofertas com dedicatórias. Há livros de todos os géneros digitalizados, organizados como uma biblioteca pública, mas também recortes de jornais. Os principais temas serão a astrologia, ocultismo, maçonaria, teatro e poesia, mas também autores de literatura como Shakespeare, Dante, Homero e Joyce.

Tenho andado a rever bastantes filmes, e nunca ponho aqui os que revejo, no entanto recomendo este The Chumscrubber, Os Amigos de Dean em Português. Quando falei dele, tinha dito que era algo que se fosse do David Lynch era bastante mais admirado, pois é um filme que não deve nada à obra dele.

De João Paulo Costrim, Salazar tem também os fantásticos desenhos de Miguel Rocha. Começa em 1968 com a queda da cadeira e regressa à infância, numa colecção ponderada da vida do estadista. O tom da história é positivo e algo humorístico, mas Rocha tem o dom da originalidade. Se os diálogos são interessantes, o grande mérito está nos desenhos.

As fotografias de Ed Feingersh durante 1995 a Marilyn In New York ganharam profundidade com a morte dela, no entanto, desta espécie de retiro que a actriz fez com 29 anos na cidade, irradia uma confiança, mas também por vezes tristeza, em 66 fotografias de extraordinária beleza e vivacidade nos momentos em privacidade.

Fotografias de António Barreto, realizador do documentário Portugal, Um Retrato Social, Ponto de Vista é o catálogo da exposição homónima. Todas as fotografias são a preto e branco, dos anos 2005 e 2006, diversificadas no tema e com Portugueses a viverem no comércio, indústria, hospitais, o Douro, cafés ou escolas. Não há nada que distinga as fotografias das de qualquer amador, não merecendo mais do que uma consulta.

Edição bilingue do manifesto O Tempo Não Existe do Flaviense Nadir Afonso já aqui referido. É um trabalho teórico, um manifesto que põe a matemática no centro da arte, insistindo nas ilusões, na posição do homem na ordem das coisas e na sua posição relativa na natureza. Em pouco menos de 70 páginas, Nadir faz a exposição teórica dos seus factos e ideias de uma maneira clara.

Ver Amália: Os Filmes de Amália Rodrigues é um olhar sobre o trabalho de Amália enquanto actriz. Os filmes não só contribuíram para a carreira musical, como para o mito. Com muitas imagens e uma competente e diversificada análise de Tiago Baptista, um jovem conservador do Arquivo Nacional das Imagens em Movimento da Cinemateca Portuguesa. Não é apelador ao apreciador de cinema comum, mas é interessante.

Do fotógrafo Holandês Anton Corbijn chegam 113 páginas de fotografias de celebridades, com uma visão única. Ele dá imenso carácter, ou pelo menos, exalta o que estas personalidades têm. Ao alinhamento de Star Trak bastam apelidos, uma autêntica constelação, Ginsberg, Rushdie, Rollins, Eazy-E, Bowie, Burroughs, Scorsese, Springsteen, Sinatra, Gallagher, Cash, Lynch, Eastwood, entre outros.

Vinte ilustradoras com diferentes estilos e influências reunidos sobre o tema Sweet Illustration, muito suave e idílico, mas mágico, com toques perversos nalguns casos. Entre Adolie Day, Kukula, Marie Blanco Hendrickx e Kelly Haigh, entre outras, algumas mais simples, outras estupidamente talentosas.

Em Basic & Advance Packaging há modelos de embalagens com as estruturas explicadas por desenhos e fotografias 2D e 3D, com mais de 300 desenhos complementares, para além de um CD com os PDFs. Do mais básico ao mais complexo, com moldes limpos para fácil compreensão, e curioso, e no caso dos mais complexos, desafiantes, útil para quem quer projectar formas originais de embalar.

Edição muito cuidada da Orfeu Negro, O Modulor & O Modulor 2 de Le Corbusier é um ensaio sobre a medida harmónica à escala humana aplicável universalmente à arquitectura e à mecânica, segundo o próprio. Muito complexo e bem investigado, com fórmulas matemáticas demasiado avançadas para os meus conhecimentos, este sistema de proporções é fascinante, até pela audácia da técnica. A edição é impecável, sem nada a assinalar, com as notas originais, desenhos e esquemas.

Uma selecção de Charuca, I Love Kawaii contém muitos artistas e estilos unificados pelo gosto do kawaii, contestários do sistema rígido Japonês em que proliferou e acabou por se alastrar a todo o mundo. Para além das ilustrações, vem com biografias dos ilustradores e obviamente, muitos bonecos e cores, com talento do Japão, mas também dos EUA, França, Alemanha, Singapura e América do Sul.

Com passagens por Paris e Brasil, Nadir Afonso é no entanto um Arquitecto e Pintor, No Mundo, tendo abandonado a arquitectura em 1965 para se dedicar aos pincéis. Subtítulo alguma obra pictórica e bibliografia activa, esta publicaçnao é então útil para fazer o ponto de situação sobre algumas coisas que se têm publicado sobre este futurista, com uma forte vertente abstraccionista, onde para além da profusão da cor nas cidades de todo o mundo que pintou com excelente movimento, há também uma útil bibliografia.

Minho, com ilustrações de Nuno Neves é um pequeno caderno sobre a região, com várias composições gráficas que tanto remetem para os bordados como para a pixel art, que faz uso da iconografia representativa. De panos e monumentos, a figuras, vestimentas e festas, a tradição tem assim uma nova face. Muito bem desenhado, num produto final curioso.

Da série Architecture Now!, Museums é uma obra com a habitual vertente visual da Taschen, mas neste caso, com análises mais profundas sobre as estruturas, muitos textos, desenhos e plano, bem como informações sobre elas e os arquitectos/decoradores. Os grandes avanços nestas instituições são realmente notáveis, sendo que alguns se tornaram mais célebres do que as colecções que alojam. No total, cinquenta projectos fascinantes, não se cingindo apenas aos grandes museus, mas com alguns mais pequenos, e Portugal bem representado.

Os desenhos rápidos de António Jorge Gonçalves de passageiros dos metros de Londres, Lisboa, Berlim, Estocolmo, Nova Iorque, São Paulo, Tóquio, Moscovo, Cairo e Atenas, foram reunidos em Subway Life. Tem piada, mas não justifica a edição e a promoção que tem tido. Sem poder escolher quem se iria sentar à sua frente, os desenhos foram feitos durante um mês em cada cidade e duas sessões por dia, com 5 minutos dispensados a cada desenho, em viagens entre 1997 e 2003.
Não tem textos e os dois desenhos mais trabalhados que cada cidade tem, valem mais que toda a gente desenhada. Muita variedade sim, mas pouco apelativo para o público.

De Pedro Campos Costa e Nuno Louro, Duas Linhas é uma edição curiosa, um registo da costa Portuguesa, com fotografias do que fosse representativo das coordenadas geográficas. Atesta a diversidade existente no nosso país, com casas, estradas, montanhas ou praias a servirem de elementos identificadores, fotografias medianas do quotidiano, que por força da evolução, ainda vão trazer boas memórias.

Crónicas: Imagens Proféticas e Outras, do recentemente falecido João Bénard da Costa, referência cinéfila em Portugal é uma colectânea de crónicas, fazendo uso da memória e com curiosas lições. De Bolonha a Hitchcock, da Arrábida a Marilyn Monroe, a sapiência e o elevado nível cultural que devia ser ainda mais exaltado pelo próprio, mostram um grande observador, que tanto discorre sobre a Grécia Antiga, como do Portugal pós-25 de Abril. Curiosamente, o cinema não é preponderante nos temas, mas nestas 400 páginas fica a sensação de uma vida maximizada, de onde vale a pena aprender.

Eu vejo e leio tudo o que posto neste blog, no entanto este O Jogo Do Mundo, de Julio Cortázar, foi folheado rapidamente, pois sinceramente não fiquei impressionado com a experiência que promete. No título original, Rayuela, de 1963 é uma revolucionária na forma, pois existem várias maneiras de ler o livro, consoante a ordem dos capítulos. Existem várias sugestões para uma história diferente, mas não é algo em que queira perder tempo, ainda que goste do autor.

De Werner Schroeter, Deux é um perturbante filme com mais uma interpretação colossal de Isabelle Huppert como uma devassa sexual. Neste caso, como uma irmã gémea em busca do equilíbrio para os seus desejos. É demasiado longo e repetitivo, mas com pormenores interessantes e demasiada ousadia.

Uma homenagem à velhice, Nunca É Tarde Demais é sobre dois homens com passados distintos que se conhecem num hospital, quando ambos têm apenas um ano de vida como projecção. Morgan Freeman e Jack Nicholson têm algo a ensinar um ao outro, mas também a aprender, e é no convívio que eles fazem à volta do globo, para cumprir os seus últimos objectivos que acabam por ganhar uma nova apreciação pelos valores da vida. Recomendável pela história.

Como é possível adivinhar, Confessions Of A Shopaholic não é nenhuma revelação, ainda que para entretenimento não seja um filme mau. Uma jovem com aspirações a trabalhar numa revista de moda é bem representada por Rebecca Bloomwood, que acaba por ir para a uma revista financeira do mesmo grupo editorial, onde a ingenuidade faz sucesso.

De uma série de fotobiografias consagrada a personalidades mais ou menos lembradas da história recente Portuguesa, li este dedicado a José Almada Negreiros. Com texto e direcção de Joaquim Vieira, é uma homenagem justa a um combatente pelo modernismo, principalmente pintor, mas também poeta, bailarino e tudo no meio. Autodidacta, instigador de uma nova linguagem que rompe com o passado, respeitando-o. Ainda que de forma sensacionalista, tem a virtude de ser um futurista, mas um patriota não conformado, tal como o seu amigo Pessoa. A obra que deixou, é de tremenda qualidade em muitas vertentes que se desafiam e a qualidade dos artigos e fotografias apresentados neste volume é superior, revisitando a história em família, onde logo em criança, é possível comprovar o talento para o desenho de Mestre Almada. Como caricaturista e usando o humor e sátira desenvolve-se, mas o virtuosismo é denunciado pelo nível dos diferentes traços de que começa a usufruir. Não avesso a zangas (Júlio Dantas, Marinetti, António Ferro), depois de Paris e Madrid, vê-se isolado em Portugal. Vira-se para o feminino, e após o casamento com Sara Lopes, atinge a plenitude, deixando um legado inigualável na pintura Portuguesa.

Ainda que o livro que eu tenho, Arquitectura de Jonathan Glancey seja um volumoso 'guia essencial' da colecção DK com vários anos, penso que o da imagem terá um conteúdo semelhante. De diferentes épocas e espalhados por todo o globo, as construções em análise vão desde as pirâmides do Egipto até ao Gherkin de Londres, sempre com o sentido de mostrar construções com sensibilidade artística. Mais do que funcional, exalta a capacidade da humanidade criar obras que a transcendem a ela própria. É bastante detalhado, até pelas legendas das ilustrações que vão até ao mais pequeno pormenor dos estilos, sendo uma lição de história civilizacional, contendo ainda uma história breve dos avanços e um guia por épocas. Muito recomendável.

A partir da história real de Frank W. Abagnale Jr., que fica para a história como um dos maiores falsificadores de cheques, Steven Spielberg recruta uma horda de actores notáveis como Leonardo Di Caprio, Christopher Walken e Tom Hanks para os dois lados da barricada.
O vigarista de 21 anos é visto a crescer, pelas profissões que assume, chamando a atenção do FBI. Acompanhando o pai, Frank vê os pais divorciarem-se nos anos 60, engendrando artimanhas que lhe trazem muito dinheiro. Não sendo uma obra prima da realização, é um filme extremamente bem organizado e cuja capacidade da narrativa não pode ser descurada. Catch Me If You Can.

Do colectivo de arquitectos Portuenses Traço Alternativo, saiu um Guia de Arquitectura: Norte e Centro de Portugal. Consistindo apenas de obras e intervenções pós-1974, é prático, auxiliado com mapas e fotografias (infelizmente, tudo a preto e branco). Todos os contactos são fornecidos, incluindo as coordenadas para dar com os locais, bem como boas descrições de algumas mais meritórias de tal. De lamentar a quase exclusiva inclusão de edifícios públicos, desde agências bancárias e universidades, a mosteiros e estádios ou centros culturais. O modernismo implementado em muitas zonas, geralmente no litoral, tem sido a um ritmo interessante, que mostra uma boa abertura das populações, mas também em zonas mais rurais e tradicionais proliferam edifícios cujos traços ambiciosos fazem agora parte da herança regional, de uma grande abertura institucional. Infelizmente, a casa em Caniçada no Gerês e uns poucos exemplos no terço do livro dedicado ao Porto podiam ser ampliados, com a inclusão de mais casas dignas de destaque. As regiões incluídas vão desde Portalegre e Santarém até Bragança.

Do surpreendente vencedor do Prémio Saramago e obviamente, filho de uma figura pública, João Tordo envia em O Bom Inverno, um contingente da arte e do cinema numa mistura de horror e romance. Dá-lhe uma dose de Europeísmo, a partir da qual não é possível apurar que o escritor é Português, com algum jeito para o diálogo (ou seja, falta de... quase tudo), com muitas referências culturais e palavras em itálico (ou seja, falta de...).
O narrador desta história tem então um tom de livro, mas não de literatura. A frustração que ele sente perante a sua imóvel carreira literária ecoa nas palavras de Tordo. Talvez ele não o sinta, e as frases sucedem-se, mas falta quase tudo. Os adjectivos e descrições estão lá, as personagens e sítios com nome exótico igualmente, mas é um rio que o escritor não consegue atravessar, arrastado por um caudal pouco estimulante cujo caminho ele próprio foi cavando. Sem qualquer noção de tempo, com vocabulário 2/5 (3 dado a alguém muito coeso, 4 a um colosso e 5 a um Deus, ou seja, nada de envergonhar, apenas fica numa panela com 95% dos livros publicados). Seguramente irá ganhar mais prémios que hão-de consistir a base de uma carreira literária sem sentido ou qualquer valor que o demarque dos próximos.

Sugerido pelo Victor Afonso, vale a pena ver esta curta animação do Checo Jan Svankmajer. Já agora, recomendo também este vídeo da Mishka por alguns sítios de NY.


Uma versão animada do novo livro da LV dedicado a malas de bagagem.

E por fim, Luca Barcellona, um Italiano com umas mãos que eu gostava de ter.


O primeiro filme de Banksy, Exit Through The Gift Shop é a história ficcional de um Francês que supostamente teria tentado fazer um documentário sobre Banksy, em seguimento da sua obsessão por filmar. Cada um há-de ter a sua opinião sobre a máquia capitalista por trás de Banksy, mas o que este documentário faz pela street art não tem preço. Com liberdade e humor, Space Invader é a porta de entrada ao mundo da street art , Monsieur André, Zeus, Shepard Fairey, Ron English e outros fazem aparições, como objectos das antigas filmagens de Thierry. A história é totalmente ficcionada, e Mr. Brainwash, Thierry convertido em artista, é uma criação de Banksy. Hoje em dia, o nome de Mr. Brainwash vende quadros em leilão, ainda que Thierry não seja capaz de os fazer, imitações do estilo de Fairey e Banksy, reutilizando obras existente. Se é tudo Banksy ou não, não se sabe, mas é uma grande manobra, conseguir criar uma segunda personalidade de alguém que não dá a cara sequer, e pô-la a render milhões. O mais hilariante são os pseudo-intelectuais a elogiar um artista que se está a rir deles nas costas pela facilidade com que acreditam que simples modificações a obras são interessantes. Como entretenimento, este documentário é um produto de inegável qualidade, quanto à vertente artística, mais vale ignorá-la.

Adaptado de uma peça de Francisco Campos, responsável, pela compilação dos textos a partir de improvisações no teatro de Montemor-o-Novo, Hans - O Cavalo Inteligente é a tela de Miguel Rocha, ilustrador Português com larga experiência e diversificadas incursões editoriais.
O cavalo Hans, tão competente que se instaura uma comissão para verificar a honestidade dos seus dotes, é submetido a perguntas rotineiras. Por entre o nevoeiro do traço e para além da densidade da história, o ambiente convida à imersão neste volume muito cuidado. Se a história promete, os cinco capítulos não são reveladores do que aguenta este triângulo amoroso, com personagens de grande potencial não atingido. Ainda assim, uma edição de grande nível no mercado nacional.

Da autoria de John Newsinger, George Orwell: Uma Biografia Política é uma extensiva análise ao movimento partidário e político de Orwell, por vezes oscilante. Com início na polícia colonial na Birmânia, depois de regressado a Inglaterra para cursar, o relato passa por Paris, Londres, a Guerra Civil Espanhola, e outros desenvolvimentos que experienciou ao vivo, que lhe foram toldando o pensamento teórico, acabando oposto ao estalinismo, como um socialista revolucionário. A obra, com dez anos, é um repensar das acções que Orwell presenciou e as suas consequências no mundo, bem como a maneira como ele as interpretou, analisadas de uma forma que demonstra como tanto a esquerda como a direita, se têm aproveitado da obra literária dele. É um exercício de análise, importante para compreender as posições de uma das pessoas mais influentes do século transacto.

Reunidos vários ensaios de George Orwell, Livros & Cigarros versa sobre o período da Segunda Guerra Mundial, cuja actualidade é avassaladora. Considerações curiosas, como ir passear ao Domingo ou jogar bilhar serem mais claros do que comprar livros, e mesmo assim as pessoas fazerem-no, ou as histórias que viveu enquanto alfarrabista, são algumas das vertentes para onde o livro recai, sem descurar a politica e a liberdade. A última metade é um só texto, 'Ah, Ledos, Ledos Dias', em que Orwell recorda a escola.

Somers Town, o olhar a preto e branco de Shane Meadows sobre uma Londres industrial, com casas e pessoas, é a história de dois rapazes, que se juntam num mundo onde as mulheres estão ausentes, até que uma muda a vida de ambos. Ela parte, e as fissuras que as mães deles representam, abrem-se. O modo como eles vêem o mundo, a dureza da emigração, de Polacos no caso de um dele, da ameaça imigrante no outro, contribui para uma cidade que vive a horas em que as ruas estão vazias. Será que uma viagem basta para mudar tudo? Acaba por falar sobre a capacidade de trabalho e as personalidades dos estereótipos que eles representam, num filme pouco ambicioso, mas convincente.

Um dos pilares da libertação animal, que pode ser visto online, Earthlings, é chocante pela realidade das situações e a frequência com que acontecem. A maneira bárbara como a humanidade exerce a sua superioridade na Terra. Apesar da voz narradora não ser incomodativa, a música constante é intolerável. As imagens são de má qualidade, até por serem quase todas amadoras e ilegais, mas isso era de esperar. Entre outros, como são explorados como animais de estimação, para alimento, roupa, entretenimento (como as nossas touradas), e ciência, são alguns dos capítulos.

Sobre uma relação com um desnível de idades, O Leitor é uma adaptação literária, sem grande profundidade. Com a Segunda Guerra como cenário, um jovem adoece com a febre escarlate e é ajudado por uma mulher mais velha, a quem, na tentativa de agradecer, satisfaz o gosto de ouvir ler. Depois de um desaparecimento momentâneo, ele só a reencontra no tribunal de crimes de guerra, onde as revelações dele a podem salver. Boa premissa e tudo nos eixos, excepto alguma vivacidade.


Quem nunca viu, Zoo York Mixtape 1, Nova Iorque clássico dos anos 90, skate com hip hop.

Estou a publicar isto aqui, porque depois de me terem feito esta entrevista e de ter tentado perceber se foi publicada ou não, nunca tive uma resposta. Por isso, mesmo que não tenha, aqui está.

VICE: Chega-te leres um jornal daqui e vir cá quando podes?
Miguel: Eu ia, mas não tenho emprego adequado aí. Se pudesse dar aulas na Faculdade de Belas Artes ou assim, aceitava, no entanto a minha família vem da classe baixa, portanto não há cunhas que me safem. Não tenho pressa no entanto, adoro Portugal e tenho imensas coisas para fazer aí, mas lembro-me dos meus professores do secundário e das vidas ridículas que levam e alivio-me em não ter de partilhar espaço com eles.

VICE: Os daí são diferentes?
Miguel: A humanidade no geral é bastante miserável e desinteressante, no entanto, tal como disse, eu só posso olhar em frente e focar-me naquilo e naqueles que são importantes para mim. O mundo hoje em dia, é muito diferente daquele em que eu cresci, e acredito que para pior. Aqui ou nos Estados-Unidos, há coisas muito piores e muitos melhores. Aquilo que cada um de nós faz da vida e a nossa capacidade de criar, no meu caso, deixa-me à-vontade para estar em qualquer sitio. Até se me metessem numa cabana na Serra da Estrela eu me ia divertir e entreter-me com qualquer coisa.

(O que se passa com a Vice e as cabanas na Serra da Estrela?) Pergunta perdida, relativa a hábitos no estrangeiro.
Só como fish and chips num sítio, por ser o único onde é feito com peixe de qualidade. Há dias em que me levanto cedo e vou tomar um pequeno almoço Inglês e vou a um sítio horrível ao pé de minha casa. Hábitos de Londrino, de ir a certos sítios no Verão ou no Inverno por exemplo, tenho vários, agora de Inglês, felizmente que não, há uma história interessante, mas a Portuguesa é muito mais interessante para mim, e as cidades deles estão podres.

VICE: Miguel, saíste de Viseu, que por si só oferece pouco a alguém com tanta fome de procura como tu. Ainda que estejas a viver em Londres há várias anos, o que é que te faz sentir tanto apreço por onde nasceste?
Miguel : Em termos de beleza natural, e as áreas circundantes, significa tudo para mim. Desde os sítios onde eu andava de bicicleta com os meus vizinhos, aos bosques onde ia já mais velho para passear, às diferentes partes da cidade onde ia jogar futebol ou andar de skate, é o único sitio a que sei chamar casa. Tive a sorte de viajar desde bastante cedo com os meus pais, e depois sozinho, porque ninguém queria/podia ver mais coisas, e vejo Viseu como uma vantagem. Relativamente a quase toda a gente que eu conheço, eu consigo ter uma ideia da cidade onde cresceram, enquanto que quanto a mim, nunca ninguém ouviu falar da minha cidade. Para além da cidade, tenho bastante orgulho em ter crescido na Quinta das Lameiras, o meu bairro, e as coisas que lá se passaram até eu ter 15 anos são mágicas e do que mais me definiu a personalidade, definitivamente não trocava essas experiências por nada.

VICE: Ainda assim, o que faz quem és agora é muito mais Londres que Viseu. Tens quê, 23?
Miguel: Tenho 23. Não, o que eu fiz foi aproveitar as oportunidades que me apareceram. Não era suposto eu estar aqui e todos os dias penso nisso, eu olho à minha volta e sei que este não é o meu lugar, porque a mim e aos miúdos com quem eu andei na escola, nem nos disseram o que era a criatividade. Diziam "pensem em ser médicos, engenheiros ou advogados, porque é isso que vos dá dinheiro" e pronto. Se eu tinha despertado para certas coisas ficando em Viseu? Possível, mas não era esse o meu caminho.

VICE: Aplicas o prazer que tens em viver também no que trabalhas?
Miguel: Sim, absolutamente. Para mim faz tudo parte do mesmo, do desejo de criar e de ver coisas diferentes. Não entendo a atitude negativa de algumas pessoas perante os desafios, por mim, se há para fazer, faço-o. As coisas em que eu trabalho acabam por ser sempre divertidas para mim porque me ensinam algo, e olha que já tive situações bem terríveis, mas que em retrospectiva foram óptimas.

VICE: E é aí que entra a Organic Anagram Industries? Num "não sei para onde vou, mas é capaz de ficar do caraças"?
Miguel: Bem, OA começou como um projecto musical. Basicamente queria fazer um album de noise, ninguém que eu conhecesse percebia do assunto, portanto pus mãos 'a obra e saiu um EP que se tornou um "clássico" no meio dos nerds das netlabels, que levou a receber desenhos de miudas, cartas emocionadas de tipos da Ucrânia, entre outras excentricidades. Saíram mais dois albuns e entretanto, estou ocupado com outras coisas. Mas sim, fiz outras coisas, cantei numa banda de hardcore dos arredores de Londres, mas entretanto saí porque eles queriam levar aquilo numa direcção que não me interessava. Neste momento, eu e mais 3 pessoas estamos a tratar de montar uma banda em Lisboa, para gravarmos algo pesado e intenso para refrescar o que se passa em Portugal. Não tem muito interesse em falar das bandas deles, mas pode-se dizer que estou excitado com as possibilidades.

VICE: Sim, mas a OA deixou de ser só um preciosismo musical teu. Certo?
Miguel: Se eu quero fazer, faço-o. Se não sei como se faz, vou descubri-lo. Quanto ao ficar bem ou mal, resume-se a isto: Se eu tenho de o fazer, vou fazê-lo bem. Sou bastante protector quanto a essa ideia, consigo ter uma perspectiva exterior e pensar "se isto fosse feito por outra pessoa, eu ia achar uma boa ou má ideia?", e é isso que me importa. É uma necessidade, se eu não vejo as outras pessoas a terem essas ideias, não vou ficar a lamentar- me, vou fazer isso para mim, e por acréscimo, para pessoas que procuram o mesmo que eu.

Se lhe perguntares sobre a Organic Anagram Industries, é mais ou menos isto que te vai dizer. Para ele, é divertido, e tira-se prazer de falar com os artistas que colaboram com ele, em partilhar as ideias com o resto das pessoas envolvidas, e até em customizar as encomendas que envia.
Para mim, não há qualquer problema em lidar com esses assuntos, gosto bastante de o fazer. Quanto a finalidade, é fortalecer esta comunidade que se tem criado, de pessoas que procuram o mesmo que nós, coisas exclusivas, com mais significado e empenho do que aquilo que se pode comprar num supermercado.

VICE: Tens ideias fortes para o futuro? Isto é, ideias de difícil concretização? Por exemplo, se há uns tempos experimentaste customizar uns próprios ténis para ti, e se há pouco, como o teu blog refere, visitaste a fábrica das New Balance aí no Reino Unido, podem-se esperar produtos de mais difícil execução? Estamos perante uma brand bem reconhecida num futuro ou queres manter isto o mais familiar possível?
Miguel: Ideias fortes, sim, ideias para um público mais abrangente, não. Isto partindo da minha iniciativa. Não me importa ter uma marca reconhecida, se depois muitas delas dão prejuízos contínuos, desrespeitam o cliente e acabam por andar de moda em moda a tentar apanhar o dinheiro fresco de pessoas que não conseguem pensar por elas próprias. Agora, se eu for abordado para customizar um relógio, desenhar um relógio ou lançar uma cor de uns ténis, é algo que gostava de fazer, em números limitados, pelo processo criativo e para oferecer algo diferente e cativar mais gente para o que fazemos.

Pergunta relativamente ao tipo de público que nos contacta e ao facto de um poder ou não controlar quem compra as coisas, que ficou perdida.
Tenho atenção a quem apelamos, porque se alguém me escreve a dizer "gostei da influência disto naquela t-shirt", então essa pessoa tem algo em comum comigo e eu quero saber mais sobre ela. De igual modo, não posso gostar ou desgostar de quem use as nossas coisas, a marca é maior do que eu, e em decisões de negócio eu não quero nem posso trazer, por exemplo, as invejas de que quase toda a gente acaba por ser vitima ou algum elitismo. A marca existe aberta a todos os que a queiram apoiar, e não podia pedir outra coisa.

VICE: Queres então manter a OAI num crescimento bem sustentável, não é? Sem olhos a mais que barriga.
Miguel: Obrigado pelo André, que é mais calculoso que eu nesses assuntos, tive de fazer um business plan para a marca, e ficou definido que temos intenção de crescer, calmamente. Todos os passos que demos são muito bem pensados, por isso nunca perdemos dinheiro (tal como não fizemos, pois não temos lucros, apenas cobrimos os custos de produção), e já tivemos de deixar passar alguns produtos que embora apelativos, ou só podiam ser em números muito elevados, ou o preço final não ia ser justo para as pessoas que nos apoiam.

VICE: Quantos sacos de plástico cheios de cd's originais me deste tu? Eram tantos, apanhava desde Hatebreed a Hip-hop's. E acho que apanhei com jazz. Como que raio arranjavas tu aquilo para Viseu em quantidades tão grandes? A culpa de tanta música vem dos teus pais?
Miguel: Acredito que bastantes. Sempre gostei de poder partilhar coisas e de mostrar CDs ou livros a amigos meus, provavelmente porque cresci sem gente que gostava do mesmo que eu em termos culturais, por isso, depois de emprestar, já angariei mais algumas pessoas para a causa do que eu gosto. Só posso oferecer a minha opinião, algumas vezes agrada-se e acabo por influenciar os gostos das pessoas, outras vezes reconhecem que aquilo tem qualidade mas não lhes agrada, ou então que os meus gostos são esquisitos de mais. Quanto ao arranjar as coisas, deve-se a ler revistas e na altura na internet, sempre soube usar bem os meios que tinha 'a disposição, tal como sempre conheci gente mais velha que lá deve ter entendido que eu tinha interesse em saber mais. É a tal coisa, eu não inventei a pólvora, só faço o que fizeram comigo, ou noutras situações, o que eu gostava que tivessem feito.

VICE: Portanto, tu estás algures entre o nunca estar homesick e o querer estar sempre onde as coisas têm significado para ti, ou tiveram.
Miguel: Mais do que ter saudades de casa e dos meus amigos, eu tenho saudades de como cresci. Eu tinha 10 anos, e juntamente com os meus vizinhos, nós estávamos na rua a jogar futebol até às 3 da manhã. No dia seguinte levantávamo-nos e íamos todos andar de bicicleta por caminhos de terra, a descobrir o que havia à nossa volta. Cada um tem as suas experiências, e estas são as minhas e do mais valioso que eu tenho. E eu tenho muitas saudades de casa, simplesmente evito pensar nisso, porque já vi tanta gente desistir de oportunidades que tiveram por não aguentarem com isso. Quando me mudei para Londres, cheguei cá com uma mala e disseram-me que não tinha quarto. Podia-te dizer sobre a quantidade de vezes que me senti injustiçado pela cidade, mas isso era ignorar tudo o que de bom me aconteceu, e tenho a certeza que quando sair daqui, ainda me vou aperceber de mais coisas. É a mesma coisa com o sitio onde cresci, será que vou focar-me nas pessoas que me diziam que eu nunca ia ser nada ou naquelas que me puxavam para o lado e diziam que acreditavam em mim? Consigo esquecer bem os desapontamentos para me lembrar de tudo o que de bom me aconteceu.

VICE: Aplicas o que vives e como vives na tua marca Organic Anagram Industries e partilha-as para quem a representa.
Miguel: Para mim, aquilo que gosto divulgo e há-de-me excitar sempre.

Estão no outro blog umas fotografias de dois sítios em Portugal.