A nova série do skater Rob Dyrdek chama-se Fantasy Factory e pode ser vista aqui, na integra. A Fantasy Factory é um parque de diversões para ele e para os amigos que trabalham com ele, e é um misto de skatepark, escritórios e campo de basket. O lançador de bola de ténis, as rampas de lançamentos são algumas das adições.
A única demonstração das oportunidades que aquele street course indoor dá é no primeiro episódio, quando o Dyrdek está a andar sozinho e depois com o Terry Kennedy e o Paul Rodriguez. Desde aí, nunca mais voltam a andar de skate lá dentro até ao episódio 6, quando os mesmos regressam.
Já não tem o Big, por isso o primo/assistente Drama é agora o parceiro dele. O Rob Dyrdek conduz tudo normalmente e por isso a série vale a pena, porque ele anda sempre contente e a fazer coisas com piada, ao mesmo tempo que investe em negócios como um motel e um restaurante.

Em Blood Diamond, desde o segundo que entra no ecrã, Di Caprio toma o filme de assalto e deixam de importar os diamantes e a tortura humana. Sim, o facto de ter sido a força motivadora do projecto e usar a sua imagem para alertar para o que se passa em África é notável, mas a necessidade de dar a cara acaba por atravessar-se no desenvolver do filme.
Há ali muito bons actores, no entanto o filme é demasiado longo. A mudança de sotaque do branquela causa uma certa confusão e, crê-se, embaraço para o próprio. Ou seja, muitos meios ao dispor, motivo nobre, mas mal concretizada, ainda que o final alijei-re o efeito amargo.

Provavelmente até teria razão, mas o rapaz de verde tem todas os motivos para sair da sala calado em vez de dar uma de rebelde. Ou pelo menos, uma bem grande.

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Este Anuário de Poesia de 1986 é composto somente por autores não publicados e editado pela Assírio & Alvim. O primeiro poema que aparece, de A. Freire Valente, "assusta", pois é realmente bom. A partir daí, são cópias de cópias, de "poetas" de todo o Portugal e mundo lusófono. Os outros dois ou três poemas que se aproveitam, estão até no terreno da prosa já, muito descritivos e longos. O curioso, é o facto de (felizmente) A. Freire Valente não ser sequer um autor não publicado em 1986, como esta página revela.

A "garagem" da Cordoaria Nacional serve por estes dias para alojar a colecção da Fundação Cupertino de Miranda, numa exposição dedicada ao surrealismo. Tem obras de Cruzeiro Seixas, Cesariny, Eurico Gonçalves, mas no geral é pouco interessante, até pelo espaço. Vale por 2/3 quadros e pelas fotografias, de elevado nível.
No CCB, está uma desinteressante sobre o Austríaco Peter Kogler, que se deve ver de passagem para o piso -1, invadido pela exposição itinerante do Arquivo Univesal - A Condição do Documento e a Utopia Fotográfica Moderna, um trabalho de pesquisa gigantesco que foi emprestado pelo Macba de Barcelona e onde é fácil e prazenteiro perder uma tarde. Grande parte do século XX está ali representado em imagens, bem como representações citadinas e de desenvolvimento urbano muito peculiares.

Christiania era o nome de Oslo de 1624 até 1877, Kristiania de 1878 até 1924.

Já teria acabado A Conspiração Contra a América há vários meses, não tivesse o livro sumido do carro. É escrito por Philip Roth, em forma, com passagens autobiográficas, mas num cenário hipotético em que Charles Lindbergh vencia as eleições em 1940 que o opunham a Roosevelt.
Partindo do cenário familiar, numa família Judaica que está rodeada por uns Estados Unidos cada vez mais anti-semitas e fascistas, temos a descrição de como um aviador coroado por Hitler sobe ao poder dos Estados Unidos e enceta uma perseguição aos "verdadeiros inimigos" da potência Norte-Americana, infligido-lhes perdas familiares.
É pessimista, no entanto o terreno ficcional em que se desenvolve torna-o uma narrativa quase cómica, um olhar exterior sobre o caos que se desenrola à frente do narrador.

A mensagem d'O Incrível Rapaz Que Comia Livros é importante, até porque em tempos tive perto de mim um caso semelhante, que tanto quanto sei, passados seis anos continua na mesma (da mesma forma que na tradução usam a expressão 'gregório' para vómito, eu estou legitimado a usar 'fritar a batatola' para explicar o que se lhe sucedeu).
O tal Rapaz, comia tantos livros que se transformou num pequeno génio, que com isso acabou por descuidar a sua saúde, até que é relembrado do que é viver.
Oliver Jeffers faz desenhos encantadores, é certo, mas o livro é muito pequeno em termos de páginas, especialmente se tivermos em conta o volume da obra de ilustradores como Chris Ware ou Tara McPherson. Faz parte da colecção Orpheu Mini, que fez muito bem em disponibilizar esta obra em Portugal.

Por altura da Expo 98 foi organizado por Fernando Rosas e Maria Fernanda Rollo este conjunto de textos intitulado Portugal na Viragem do Século - Valor da Universalidade, em que cinco estrangeiros analisam o papel de Portugal.
Alguns dos temas são as diferenças históricas entre Portugal e Espanha até às mais recentes ideias para a agricultura e pesca, o abraçar da democracia no pós-74 (Lawrence Graham tem talvez a mais detalhada análise do período que já li), os sonhos que as províncias de África alimentaram, entre outros.
Passado, presente e futuro do país em diferentes assuntos, numa grande lição de Portugalidade dada por estrangeiros.
Portugal simultaneamente continental e oceânico, onde a terra acaba e o mar começa, mas também onde o mar acaba e a terra começa.

Lançado em 1846 e de acordo com as correntes modernistas que Almeida Garrett seguia, As Viagens na Minha Terra começam com uma boa ideia. Fazia parte do antecessor deste plano nacional de leitura e por isso tive de lê-lo há uns anos atrás. No regresso, não fiquei com melhor impressão.
Garrett e o seu grupo excursionista de centro comercial saem em viagem, seguros da sua superioridade em relação a tudo e todos. É pedante, um misto de ilhéu com nortenho é sempre um risco, uma constante ilusão de falsa grandeza.
Desaponta como o pinhal da Azambuja, eu sou apenas mais sóbrio a dizê-lo do que Garrett é na descrição desse episódio. Em discurso directo acaba por se tornar fraco, sem estrutura ao confundir a viagem real de Lisboa a Santarém, que podia ser uma descrição interessante, com a história de Carlos e Joaninha com um Frei Dinis misturado. Para aliviar disso, resvala para histórias das avós ou então atira com uns nomes para a 'academia'.
A certa altura, avisa:
Este capítulo não tem divagações nem reflexões nem considerações de nenhuma espécie, vai direito e sem se distrair.

Mal de quem acredita. Assim que descarrila, nunca mais volta a encontrar o rumo.
Resumindo, a ideia de diário de viagem é boa, escorrega para um pedantismo estilo Câmara Clara e quando damos por nós, temos um Carlos e uma Joaninha num drama de Domingo ao início da tarde. No secundário avisaram-me que podia fazer o teste se lesse as sinopses dos capítulos em vez do texto principal, não é exactamente verdade, mas sem ter de fazer testes, basta.

A Confissão de Lúcio de Mário de Sá-Carneiro tem uma forma pouco comum. Depois de preso durante dez anos, Lucio Vaz resolve provar a sua inocência na morte do poeta Ricardo de Loureiro e Sá-Carneiro passa a contar a história na primeira pessoa, sofrendo com isso, torna-se linear, impermeável a alterações de narrativa. A cumplicidade entre eles, os ambientes românticos e a presença de Marta, abanam a acção, que acaba com um suicídio.

O Alentejano Luis Carvalho vê editado Buraco Branco, um pequeno volume de poesia. Se no grafismo e organização é irrepreensível, o conteúdo levanta sérias duvidas. O que me move na poesia parece estar aqui ausente, tem versos, mas falta-lhe o toque majestoso, o dom que separa os homens dos poetas. Banalíssimo.

No ano de 1899 foi publicado o ultimo drama do Norueguês Henrik Ibsen, uma peça de teatro, já depois de ele ter 70 anos. Em When We Dead Awaken, as personagens são bem trabalhadas, sendo o leitor atirado para o âmago do casal Rubek logo no inicio. O professor/escultor, começa a perder o interesse em tudo, incluindo a casa, e quando se depara de regresso a paisagens familiares e a perder a mulher para um caçador de ursos, deixa-a partir, quando vê uma paixão antiga, metafisica, a circundar os bosques. Existe também descontentamento de parte a parte, sendo um interessante desenrolar da acção.
A descrição das mulheres de branco e negro é fantasmagórica, revelando depois uma faceta amigável, ainda que impregnada de rancor. Rubek, gasto pelos anos em que Maia não o acompanhou intelectualmente deixa-a circular pelas montanhas atraída por Ulfheim, o caçador de ursos, enquanto reacende a chama com Irene, um espectro fascinante. É realista, duro, com ódio e indiferença. O final é arrebatador. Trabalho de mestre.

Publicado em 1990, Terral de Miguel Castro versa sobre o marítimo, o Verão, a amizade. Ao ler a introdução de David Mourão Ferreira, auspicia-se o limiar da sumptuosidade em verso, mas poucos poemas têm mais de oito versos, sendo todos muito reduzidos e material pouco original/convincente.

Há refeições que valem pelas entradas, Across The Universe vale pelos momentos em que não é o filme que auspicia ser. O que seria um musical com musicas dos Beatles, é um High School Musical para a geração acima do Mamma Mia. Tem problemas de cadência, com o constante saltar de locais sem qualquer ordem ou sentido. Mediante companhia participativa, transformem o filme numa busca por referências das cenas (entre outros, conta-se Grease, Dead Poet's Society, Gato Preto Gato Branco, Charlie e a Fábrica de Chocolates, Resgate do Soldado Ryan, Kids, Moulin Rouge). Vai tornar o serão bem mais interessante.

Era minha intenção dar destaque às novidades da streetwear, mas entre a Obey x Bad Brains que sai para a semana, a nova colecção da 10Deep e os keyrings da Original Fake, não há nada novo. O ultimo ano tem sido marcado pela queda das marcas que dominaram os últimos 4 anos, tudo muito previsível, constantes revisitações a modelos antigos em nada justificadas e um retrocesso geral na qualidade. Melhores tempos virão.
Na nova DIF estão uns artigos meus. A partir de agora a colaboração vai ser mais regular. Podem vê-la online ou apanhá-la gratuitamente em vários pontos do país.
O Funcionário Cansado publicou uma entrevista antiga do Jornal de Letras ao Mário Cesariny que vale a pena ler.

Somente pela curiosidade, tive ontem nas mãos um exemplar original de 1878 do Manual Bibliographico Portuguez escrito por um bibliotecário do Porto chamado Ricardo Pinto de Mattos e nesta edição prefaciado pelo Camilo Castelo Branco. Para além de me ter enchido as mãos de pó, supreendeu-me pelo conhecimento super detalhado das biografias e bibliografias de tanta gente, incluindo os valores das edições. Isto há 130 anos...

Antologia Poética reúne quase toda a obra da poetisa Natércia Freire (falecida em 2004). É uma escrita no feminino, alguma jovialidade, a pele nua, as luas, o branco e o rosado, no entanto com morte e sombras por perto, numa paisagem descrita com detalhe. Vai buscar algumas coisas na água, a pureza, mas numa inclinação para o nevoeiro, patente na grande ode ao sonho que é o poema homónimo. Vale a pena ler, até porque naquele misto de decadente e sorridente, há muitos conceitos interessantes.
Sempre meio e nunca extremos
Sempre entre a Morte e a Vida

Pode definir bem a poesia de Natércia Freire.
O posfácio de Ana Marques Gastão tem humor de primeira linha. Ou qualquer coisa parecida, pelo menos, fez-me rir.
Tudo que em mim é fracasso
Já não tem raiz humana
Nas pontas do mesmo laço
É que o aço nos irmana.

Convosco em pó me desato
E a viagem não termina.
Parto de mim em retrato,
No movimento sem acto
Que o Destino me destina

Fui hoje aproveitar o sol ao observatório de Greenwich e tive uma surpresa com o National Maritime Museum, onde nunca tinha entrado. O tecto em vdiro torna o espaço muito luminoso, e todo o museu é moderno, com animações e replicas de navios antigos e alguns originais. Cobre desde os dias de hoje até aos descobrimentos, por isso é dos poucos museus que fala de Portugal, neste caso devido ao tratado de Tordesilhas.
Os dispositivos para mostrar peças como fardas maritimas são modernos, sem ser tecnologia ao desbarato (entre as fardas, está a que Nelson usou na batalha de Trafalgar, onde é possível ver o sitio da bala), mantém as peças como centro.
Para além das descobertas, também há navios de lazer e embarcações que fizeram história pelos progressos técnicos.
Os vitrais do Baltic Exchange são interessantes, fruto da recuperação depois do atentado de 1992, que destruiu a sede em Londres. E logo acima existe o observatório de Greenwich, recomendável também.

A adaptação do livro Gomorra de Roberto Saviano atesta o limite a que o género chegou. Tentam dar a volta a dar uma perspectiva mais Europeia, mas é desinteressante, fraco. Tirando a cena no rio onde disparam a Ak47 e a Mp5, não existe nada digno de menção.

Em 1974 um Francês atravessou a distância entre as duas torres do WTC, Man On Wire recria os momentos antecedentes e os motivos por detrás da proeza. O que surpreende é a determinação, ao mesmo tempo é um caminho de descoberta, mas é como recriar o presente, o destino já está traçado. O entusiasmo e a paixão de Philippe Petit e dos amigos vale a pena ser visto, bem como a inteligência posta no planeamento. A distância entre ficção e documentário é esbatida, com uma recriação das cenas cruzada com várias filmagens da época. Bom.

Desobri Jason Limon por ele ter quadros em exibição numa galeria que também tinha outro artista que eu gosto. Há pessoas que parecem ter sido concebidas com mãos desumanas.

Dois anos de trabalho e 40 a amealhar 250.000 objectos de colecção permitiram a David King fazer este Red Star Over Russia em colaboração com a Tate, uma excelente história visual da era do comunismo. Começa com a revolução em 1917, a guerra civil, passando pela derrota dos bolsheviques e o surgimento do estalinismo, até ao combate dos invasores nazis. A introdução que descreve o interesse de King por Trostky é uma adição soberba, e foi essa ideia de registar Trostky, que Estaline tinha tentado apagar da história, que impeliu King para reunir esta colecção.
As notas histórias são bastante completas, bons complementos às fotografias de alta qualidade.
Os comboios de propaganda e aquele que Trostky usava e os fantásticos posters anti-capitalistas, que foram o melhor que a guerra civil trouxe, são boas adições. A partir do período em que Lenine morre e que culmina com a ascenção de Estaline, os materiais apresentados tornam-se tecnicamente mais apurados, mas a história perde parte do interesse com o "reino de terror".
As fotografias de todos os condenados dos dois julgamentos de Moscovo são apresentados aqui pela primeira vez, também com importantes notas sobre as vidas deles (do terceiro julgamento não há registos, apesar de aparecerem fotos de outras fases da vida dos julgados).
É doentio ver a brutalidade das torturas cobardes ordenadas por Estaline e desconfortante pensar que existe quem defenda estas causas, que não se extinguiram há assim tanto tempo. A fase da invasão Nazi é contada por fotografias, sendo especialmente atrozes as da resistência de Leningrado.
Em termos históricos o livro é muito bem composto, e esteticamente tem material de alta qualidade e muito bem preservado, sendo altamente recomendado para quem se interessa pela história do último século.

Aparentemente é possível comprar agora em todo o lado Pacheco vs. Cesariny, uma prenda amarga de Luiz Pacheco a Lisboa, onde publicou as cartas que trocava com o círculo de amigos. A primeira, ao grupo surrealista é como um dilúvio, descarga logo tudo, mas entretanto acaba por até amenizar. Mais do que projectos, discute-se dinheiro.
A maioria são com Cesariny e Ricarte Dácio, ambos em Londres e preocupados com a sua saúde financeira, bem como Bruno da Ponte da Letras e Artes e Virgilio Martinho.
Delfim da Costa, o triunvirato cangalheiro da cidade tem uma boa participação, só se pedia mais.
Para o fim, Pacheco é rude para com Cesariny, que via-se nitidamente que o estimava, mas a maior parte da correspondência até é bastante cordial. São 350 páginas, e tem piada toda a excitação em volta da edição do Pacheco na Ulisseia, e o Virgilio Martinho começar uma carta a lamentar o facto de ele ter sido apreendido (ainda assim, saiu uma crítica no Diário de Lisboa pelo Eduardo Prado Coelho, que o Pacheco odiava [e ainda queima o Urbano Tavares Rodrigues e o Baptista Bastos, como de costume]).
A certa altura, Pacheco diz:
Quanto a mim considero-me o único escritor Portugês vivo. A minha obra é toda epistolográfica. Cartas e mais cartas. Hoje, com esta é a terceira. Cartas a pedir, cartas a agradecer, cartas de caridade.

Para quem escreveu tão pouco, realmente esta colectânea tem um ritmo desmesurado, e a validade da edição vai além da "coscuvilhice" e do interesse de Luiz Pacheco em denegrir as pessoas, porque são mesmo documentos muito interessantes e excelentemente redigidos.

Saúda-se a reedição de Poesia de António Maria Lisboa, livro organizado por Mário Cesariny a partir do espólio que sobrou.
O texto "Erro Próprio" é o arranque, depois de uma comunicação desinspirada, e que sublime que é. Não traz nada de novo, mas o raciocínio lógico e as cadeias de ideias que se estabelecem são dignas de uma leitura atenta.
Com a intenção de dizer o que já deveria ter sido dito, para poder continuar com o que ainda não se disse, e que tem com o que fica neste expresso, apenas ligações de raízes.

Os poemas, a dita poesia, não são nada do outro mundo. São sim, muito Parisienses. Marcados pelo esoterismo, Grécia, Egipto, mas com pouca substância ao nível dos outros textos. Aquelas declarações de falso romantismo estilo Gina-Cais-do-Sodré-Beira-Rio-ao-pôr-do-sol tem um trago a intragável já. O poema "Virgula" tem a sua graça, contudo.
As considerações sobre o universo devia-as ter feito só para as estrelas e a carta do Sr. Cágado é uma aberração que deve ser lida em 15 segundos, o que inclui um desconto para virar as páginas.
Se na data da morte, António Maria Lisboa tinha apenas 25 anos, o espirito estava lá todo já. O organizador do volume, Cesariny, devia ter deixado muita coisa de fora, pois simplesmente não tem nada que justifique a página em que é impresso.
As cartas no final são uma brilhante inclusão, uma das primeiras, em que ele se dirige ao Grupo de Lisboa, bom material, bom.
As artes mágicas e ciências ocultas ou observatórias como António Maria Lisboa lhes chama, são as culpadas pelo lixo, numa obra que vale por si só, mas que prometia ainda muito mais com o amadurecimento. Já agora, a titulo de curiosidade, a Maria Helena que ele menciona estar casada em Paris com um Húngaro, é a pintora Vieira da Silva.
Vale como uma edição "definitiva" do que sobrou da obra, mas umas horas de corte e costura e ficava-se aqui com uma fatiota bem mais aprimorada.

Os documentos aqui contidos, segundo a user Patins do FSons, têm uma história engraçada. Citando-a:
Há mais pérolas sobre esse estrilho todo no Textos de Guerrilha. Na verdade, essa história é muito triste com o pai do Lisboa a destruir a obra dele depois de ele morrer e o Pacheco a ir buscá-la ao lixo da família Lisboa e a colá-la com fita-cola para a entregar à Guimarães Editora para que a publicasse e esta sem a publicar e a deitar fora a obra do Lisboa 10 anos mais tarde porque tinha a bela política de destruir todos os originais que estivessem 10 anos sem ser publicados...
Posto isto, o Cesariny fez o que podia fazer: publicar o que restou, que é pouco comparando com o que chegou a existir (Máquina de Guerra, Marfim, Pequena História a Mais Fantástica dos Amorosos triste e eternamente perdidos...) mas que ainda assim é imenso.

Fica aqui também um texto do Luiz Pacheco a disparar fogo acerca desta Poesia.

O Cesariny Muito Cansado
Mário Cesariny de Vasconcelos acordou um dia destes muito cansado. Imaginem o que tinha acontecido: na véspera pegara nos livros do António Maria Lisboa, um Poeta morto (que os mortos não têm opinião, é preciso adivinhá-la, sabê-la antes das coisas acontecerem, mas para isso há que ter a alma íntegra, há que preservá-la do caruncho), eram cinco folhetos rasos, um tinha só 6 páginas escritas em rodapé, outro era só uma página…, foi buscar uma tesoura e começou a fazer recortes, a seleccionar. Era uma verdadeira brincadeira de garoto, a própria tesoura estava espantada com a facilidade daquilo: onde as páginas estavam cheias de linhas, dizia-se que era prosa e punha-se para um lado; onde as linhas eram muito curtas e não enchiam a página toda, dizia-se que era poesia e punha-se noutro lado. Aquilo era tão fácil, que lá mais pró fim já era a tesoura que fazia tudo sozinha, muito entretida com a tarefa, enquanto o Cesariny escabeceava cheio de sono, cansado, muito cansado. Fez a tesoura dois montinhos baixinhos de papéis cortados, acordou o Cesariny que foi buscar uma guita e atou os dois molhinhos seleccionados. E como talvez fizesse jeito meter qualquer laracha dele foi às gavetas, cada vez mais cansado, e pôs-se a escolher entre o cotão e a farrapagem doutros tempos, donde já lhe tinham saído, por um feliz acaso, os seus últimos livros; encontrou um panfleto antigo, chapou-lhe uma data, sacudiu-o do pó, parecia novo, servia que nem ginjas, dava um prefácio todo catita para o montinho da prosa. E para a poesia? Não lhe vinha ideia nenhuma… Que cansado estava! Tornou a rebuscar na gaveta, mas não achou nada que prestasse. Ora! ia mesmo assim! Ninguém havia de reparar.
Pediu à velha oito tostões pró eléctrico e veio à Baixa, foi à editora, vendeu os dois molhinhos do morto. Depois, já mais satisfeito mas ainda muito cansado, foi à tipografia mandar fazer dois volumes; esperou: em meia hora estava tudo composto, reviu os granéis (trabalho que o deixou ainda mais cansado), mandou paginar, meter na máquina. Foi ali ao lado e enquanto bebia um café – cansado, muito cansado! – escreveu uma aldrabice qualquer para a capa a dizer que o António Maria Lisboa «com 25 anos apenas, criou um dos testemunhos mais válidos das recentes gerações» e que o «ERRO PRÓPRIO» aparecia na «Ideia Nova» como homenagem a um grande desaparecido que uniu a linha surrealista ao plano maior da poesia portuguesa». Depois desta bofetada (indirecta) no Breton, que o deixou verdadeiramente cansadíssimo (e ao Breton? não se sabe…), pensou que não havia tempo a perder, agora que ia assim, é que ainda tinha de escrever um artigo (grande) muito elogioso sobre a Vieira da Silva, a engodá-la, a tornar-se lembrado, a ver se a convencia a arranjar-lhe a tal bolsa da Gulbenkian, que isto de mortos, mesmo poetas, mesmo poetas e amigos, não dá nada. Só arrelias. Só canseiras.
Voltou à tipografia. Tudo em ordem. «E quer levar já?» Pois! Desceu o Chiado carregado com os livros, cansado, muito cansado, em cada braço um volume, no direito a Ideia Nova a verde, no esquerdo a Poesia e Verdade cor de chichi; fazia um vistaço. Entrou no Gelo, a mostrar aos amigos as suas últimas obras. Fez algumas dedicatórias que bem mostravam o seu grande cansaço. Tiveram pena dele, que se devia poupar, que já não eram para a idade dele aquelas correrias pelos editores, que deixasse isto para os rapazes das gerações mais recentíssimas, que talvez eles viessem a falar do Lisboa com outro merecimento. E mandaram-no para casa, que fosse dormir. Que se via que estava muito cansado. E foi assim que tudo aconteceu.

Penso que já o tinha visto, mas apareceu-me a oportunidade de rever The Departed e fica aqui. As personalidades fortes do elenco enriquecem o desenrolar lento das operações, até que nos últimos 15 minutos o filme há mais tiros do que toda a filmografia do John Ford. Os círculos que se estabelecem em volta dos intervenientes apagam a fronteira entre informador e quem é denunciado, sendo todos culpados de algo. Matt Damon e Di Caprio conseguem dividir bem o protagonismo, para filme de acção, nem é mau.

A edição da Primavera da Tisch Film Review, uma revista feita por estudantes contém três entrevistas, a Noah Baumbach, Ryan Fleck e ao produtor Alan Ladd Jr., a mais interessante e aquele que tem o maior currículo e agora tem uma produtora independente.
Tem também textos sobre Sokurov e a sua obsessão por corpos mortos, a ideia de Clint Eastwood da América e como é vista de fora, a violência dos filme "torture porn" como Hostel, e várias análises da politização no cinema.
Por vezes tem um discurso demasiado relaxado, mas até tem alguns artigos de interesse.

E com Sleeper encerro o ciclo Woody Allen. Woody vê-se transportado para o futuro, o cenário apesar de ter pormenores deliciosos como os carros e os robots (ambos eficazes em écran) é propositadamente de aspecto barato, com vários edificios em cartão. Tem bons momentos, mas nunca atinge um nível superior, e algumas invenções, como o casulo onde Woody pretende viver, que prendem o espectador. As cenas em que ele faz de mordomo serão porventura o ponto alto do filme.
Existem muitos acenares aos Irmãos Marx, incluindo o comentário final, que parece tirado a Groucho. O traço politico e a visão pessimista do "eu" relembram-nos de quem é o filme.

tinha posto aqui umas palavras do Medina Carreira, mas vale a pena ver esses 25 minutos com o Mário Crespo.

Crespo: Pensa formar um partido?
Carreira: Casas de mulheres de má fama já há que cheguem.

Não vou escrever o nome da apresentadora porque não a quero associada nas buscas ao meu blog, mas podem ver aqui um programa sobre o surrealismo em Portugal, com alguns trechos interessantes, isto se conseguirem ignorar a voz, o olhar, os toques de cabeça, os piscares de olhos, a pronuncia, o pretensiosismo, et al da moçoila.

Terror e Miséria do Terceiro Reich é uma peça escrita para teatro por Bertolt Brecht. Dado que não existe propriamente uma história, sendo a sucessão de cenas, dando a perspectiva do Terceiro Reich de vários estratos sociais, não percebo bem como é que isto funciona em teatro.
Alguns versem antecedem cada cena e sumarizam o que se vai passar. A primeira começa com dois bebedos que matam um homem por suspeita e dá o mote para o resto da peça, num clima de suspeição contra maridos, empregados, sempre com medo de serem denunciados.
O homem das SA em casa dos patrões da mulher começa sisudo, mas sem nunca se esquecer da causa, experimenta piadas com um trabalhador da casa, que quando a retribui é indirectamente lembrado do respeito que tem de ter.
A questão de justiça entre o judeu, o sócio, o empregado e o senhorio é muito interessante, fazendo uso da ironia, tal como é visível na cena do cirurgião no hospital.
Brecht consegue criar uma série de situações que criticam o governo de extrema direita, aproveitando as vozes do povo para aliviar a tensão e introduzir criticas ao governo sobre a forma de um humor inocente. Recomendado.

They Chose China é um documentário feito acerca de Americanos que, após a guerra da Coreia em 1954, decidiram ficar na China em vez de regressarem aos Estados Unidos. Nem fiquei a perceber o que lhes passou pela cabeça, para irem de Americanos que defendem o país, até se negarem a voltar para lá, mas sem duvida que tiveram vidas interessantes ao permanecer na China.

Antes de ser lançado pela Hearthworm (da qual Wes é dono), Deathbeds foi motivo de intensa discussão. Era o primeiro lançamento de Wes Eisold, que começou por escrever mas que se tornou vocalista e face dos American Nightmare/Give Up The Ghost de Boston e depois de os abandonar, Some Girls. Incluídas estão todas as letras das bandas, bem como peças de zines (incluindo um diário interessante de Some Girls), poemas inéditos e outros antigos.
A edição de mil cópias fez com que os preços aumentassem e de certa maneira, justifica-se. As referências da vida moderna em alguns poemas enfraquecem-no, mas a fórmula de dois versos incisivos, uma via aberta entre o coração e a cabeça, que ele encontrou, revela-se proveitosa. Devia cingir-se aquilo em que é bom (muito bom), a transcrição dos sentimentos crús de quem foi deixado sozinho, de quem está rodeado de gente mas sem ninguém à volta.
Não é explicito, mas eu penso que o livro está ordenado cronologicamente, começando em 2006 e indo até 99, a fase que corresponde às letras de American Nightmare e o que constituí o atractivo deste volume.
A temática é linear mas não superficial, a projecção da incapacidade de Wes lidar com o mundo e as marcas que o amor lhe deixaram.

Tinha este Autonomy and Ideology - Positioning An Avant-Garde In America na mesa aos meses para ser lido. Comprei-o por ter havido uma altura em que estava a escrever várias coisas sobre o significado (definitivo?) de avant-garde, no entanto só agora ao abrir é que reparei que era de arquitectura e não de arte (aos arquitectos, eu sei que pode ser arte, mas dêem um desconto aqui ao leigo).
Ora isto foi editado por causa duma série de conferências em Nova Iorque em 1996 e vale a pena ser lido pelos interessados na matéria, apresenta o trabalho de muita gente, em diversos formatos, criticas, ensaios, desenhos e exemplos concretizados.

Há certas coisas que mais vale não ver. Communication Arts, o anuário de ilustração agora no número 49 devia ser proibido. É frustrante ver tanto talento junto. Os editores queixam-se que houve menos entradas que em anos anteriores, mas ressalvam o altíssimo nível dos trabalhos, divididos em comerciais e pessoais. Existem obras primas da modificação digital, bem como muitos clássicos de óleo sobre tela, acrilicos, madeira, de todas formas e feitios. Já que não é possível ao comum dos mortais igualar, ao menos admire-se.

Em vez de Magalhães e CDs, o Estado devia era investir nisto para os alunos. O papel da Tabuada é nostálgico, aquele amarelado gasto dos anos, apesar de ser uma publicação nova. Nas 16 páginas deste folheto encontram-se as várias tabuadas, bem como os numerais cardinais, ordinais, numeração romana e outros princípios e medidas básicas e úteis.
Não sei quem é o autor, mas só aquela ode os "mestres" inscrita na contra-capa, deixa saudades, lado-a-lado com uma missiva para se tratar bem das árvores.

Epocha é uma zine fotocopiada do Kentucky. O começo experimental é auspicioso, o rapaz que a faz começa por contar a história de como é o hardcore quando se vive numa cidade rural e se tem de guiar horas para um concerto. Tem boas entrevistas a Blacklisted e Bitter End, no entanto tem apenas 3 reviews. O papel é de grande qualidade, não é fotocopiada. Prometedor.

Another instalment of the interview series. Once again, same old rule, if it was done in English, no need to translate it. This time I have Davin, who sings for Philadelphia vegan straight edge band xKingdomx. She is incredibly enthusiastic live and plays with her heart, saying some serious things while keeping the rage in her eyes. Being a girl in hardcore, she must take a lot of shit that I never had to experience, so even more respect for that. Here it it what she had to say.

How do you spend your time? What are you plans, you mentioned that you had the idea of moving to Europe...

Outside of band stuff (which takes up most of my time), I… lets see. I hang with two wonderful cats named Pippi and Ella. Lately I’ve spent an hour a day reading Emily Dickinson poems and recently found myself able to recite them, which made me think of elderly people and their tendency to break into song or poem- MUCH to the embarrassment of those around (or related to) them. So perhaps I’m senile. I ride a rusty red bike around, drink a lot of coffee, listen to records, and spend a time of time at my desk writing. I’m hoping to write a book this year based on my adventures and the lovely, hilarious, and stupid people I surround myself with. I occasionally work (I hate working), but my job is fucking awesome (but I still hate it). I’m a children’s face painter. I’ve been doing it for 4 years. Later this year I’m going to break off from my company, moving to Richmond, Virginia (4 hours south of Philadelphia) and start my own.
And yes, hardcore bands only stay together for so long, and when Kingdom is done I (and our guitar player/my best friend, Dave) are moving to Barcelona, Spain.

How did you get into hardcore?

When I was 12, these dudes (who later went on to start a band called American Nightmare) were passing out flyers for a hardcore show at a Primus concert, and passed me one. I loved music, mostly metal (as a little kid I had been completely consumed by my love of Guns N Roses and idolized Slash), so I went. From the second I walked in, I knew I was home. That’s the short version of a very long story.

Since you arrived in Europe you have been a victim of your lifestyle, you had problems in your foot from jumping around, you got sick from non vegan food. In a weird way, do you wish that you could wake up and just worry about the next club night and sit around your room all day or you think this is all worth it?

Fuck no! I’m not made for a boring life, I’ll leave that to someone else. Injuries and illness suck for sure, but I enjoy it all. The day I thought I might die from my gigantic, purple and grey foot (French doctors told me it could be fatal- turns out they were wildly overreacting and it was just a really bad, really swollen sprained ankle), I was laughing and trying to get our guitarist to film me giving a tour update. It’s all perspective, you know? It’s like Peter Pan said, “To die would be a great adventure!”

What are your goals with xKingdomx, do you want to see it get bigger or you don't take it seriously?

That’s kind of a funny question. I feel like for a hardcore band, we’ve about done all we can do. We’re on a decent label, well distributed, touring almost all year long. I guess we could try to be on Victory or Metal Blade, but that would be all semblance of DIY going out the window and we wouldn’t even really be a hardcore band anymore. I’d say we’ve successfully reached our goals, and now we just want to tour, tour, tour. If that makes us bigger, that’s cool. If it doesn’t, that’s cool too.

You guys play Minor Threat and Bulldoze covers, which is a match made in heaven to me!

Me too!

You must feel dissatisfied with what you see out there, if you could make one definitive change to humanity, what would it be?

That is a hard one. Okay I’ve thought for 3 seconds and come up with this: I’d take Patriarchy out of the mix and see what a world of equal human beings would look and feel like. All people are effected and oppressed by Patriarchy, from men being socialized to dominate (other humans, women, the world), to women being socialized to submit (this needs no explanation), from people who are both or neither being outcast and despised for not fitting into the gender binary, and the way that we stifle parts of ourselves (“boys don’t cry”, “don’t be such a tom boy”)… we are all forced into molds we don’t fit, and we all suffer from it.

The new record is coming out, right?

Yes, the new record, The Rage That Guides, is out March 31st on Eulogy Records.
Thanks for the interview!

Listen to xKingdomx.

Logo após o Van Dyck, apanhei o barco para ver uma interessante exposição sobre o construtivismo Russo e as suas duas maiores figuras, Rodchenko & Popova. A exposição começa em 1917, ano da Revolução e numa fase madura de ambos os artistas, num país violento face a escassez de comida.
A construção e composição dos elementos no construtivismo é de uma elegância quase mecânica. A engenharia fornece muitos conceitos, e parte da imediatez está em arranjar os materiais cientifica e objectivamente, numa reconfiguração do significado de arte. Não é objectiva, usando formas cuneiformes e circulares, mas com composições aperfeiçoadas e forte infusão de cores, principalmente na sua fase mais avançada, o que acaba por distinguir o movimento do cubismo.
As linhas ocupam tanto um espaço bidimensional como poli-angular, sendo o elemento fundamental, existindo por sua própria validade, mas também como enquadramento da forma e como a sua continuação no espaço. A organização Russa que pauta inclusive a actividade criativa é disposta em desenhos, pinturas, cartazes e muitos outros items, destes dois artistas soberbos e tecnicamente perfeitos na sua precisão.
Por hábito não escrevo aqui sobre exposições, porque já tenho de escrever sobre elas para revistas ou jornais, e acabo por não ter paciência para fazer outro texto. Como estas fui em dia de recreio, ficam aqui umas ideias em tom informal.

Havia mesmo muita gente na Tate para a retrospectiva do Van Dyck. Ele foi um assistente do Peter Paul Rubens (talvez o maior apelo para mim, já que não sou admirador dele), e contemporâneo do nosso Grão Vasco, portanto, do inicio do século XVII. Pintou a Grã-Bretanha, onde já havia ido de passagem, de um tom mais senhorial, majestoso, retratando a nobreza e as famílias abastadas em volta da corte. O elevado ritmo de trabalho e dedicação tornou-o num dos mais requisitados pintores da época e que teve uma grande influência nos anos vindouros. Existem também em exibição alguns estudos do mundo natural, bem como quadros de pintores precedentes e directamente influenciados por Van Dyck.
A Altermodern é, quase toda, de evitar. Tinha ficado bastante desapontado se tivesse de pagar para ver aquilo, no entanto a salinha dedicada ao pintores rurais dos séculos XVIII e XIX é uma interessante montra naive, e quase que se desculpa o facto de a galeria Turner estar quase vazia, enquanto os quadros estão em exposições na Russia e China.

Não Me Fodam o Juizo de Colin McGinn é sério. Foder o juizo ou a designada psicofoda é um acto temível, pois o individuo está a par do que se passa e faz tudo para se desprender da situação. A tradução de mindfucking, tem uma componente mental, mind, e a fisica, fucking, claro está. Não é, por definição, mal ou indesejável, e pode até ser positivo. Ver um filme que nos fode a cabeça é estimulante e nós procuramos esse tipo de desafio. No entanto, tem de existir uma permissividade que deixa a outra pessoa explorar as nossas fraquezas, remexendo nos medos e deixando marcas, como é o caso do clima de claustrofobia nos governos ditatoriais, um exemplo da vertente negativa. O raciocínio é simples e sucinto, sendo uma leitura interessante. Apesar do tema, é filosofia a sério.

Como desde há uns meses para cá venho a analisar o expressionismo abstracto, foi até num livro mais generalista da Taschen que encontrei dois artistas em quem nunca tinha reparado.. Se é comum ver representações de Mark Rothko, Arshile Gorky, Jackson Pollock, Ad Reinhardt ou Willem de Kooning, o que me surpreendeu pela novidade e frescura, foi Lee Krasner, a mulher de Pollock e talvez por isso mais "escondida", que pelas obras que analisei é incrivelmente versátil, e Mark Tobey, mais velho que a geração de Nova Iorque (n.1890), mas com um estilo meticulosamente detalhado e minucioso, quase infantil.
Dois de Lee Krasner


E dois de Mark Tobey


Viking Manifesto, escrito por um Americano e um Sueco radicado nos EUA é um livro de técnicas empresariais muito interessante. As histórias recentes que ilustram a ética herdada do imaginário Viking são breves e com associações díspares, mas a base teórica está toda semeada, sendo o humor apenas a cobertura.
Promove a agressividade no mercado, mas lembra que sem um bom produto, não se chega a lado nenhum, e em como a via aparentemente mais fácil, de empregar crianças e mulheres no terceiro mundo, ter os trabalhadores insatisfeitos, nem sempre é a que vai trazer mais lucros. Em vez de competir, eles pedem que as pessoas contribuam. Os interludios com a história Nórdica e o misto de poemas rúnicos com citações da cultura pop tornam este produto muito apetecível, obviamente. Eles foram responsáveis pela Absolut, uma marca que ninguém acreditou e é um dos grandes exemplos que conjuga técnicas de marketing, design, estudos de mercado e claro, sorte.

A violência dos danos físicos e psicológicos nas crianças e adolescentes que nasceram na zona afectada, que os expôs a uma radiação 90 vezes superior a Hiroshima é filmada em Chernobyl Heart and Children of Chernobyl. A idade das pessoas com cancro e tumor, bem como a forma como têm de lidar com o solo infectado é assustador. As doenças cardíacas e a forma como o sistema imunitário é destruido são exemplificados com casos aterradores.

Com apenas 8 minutos, existe este documentário da Vice que guia-nos na zona atingida.

No filme Bloodsport, é possível ver uma gravação no interior da Walled City de Kow Loon, em Hong Kong, que foi demolida em 1993. Desde 1974, altura em que as Triades foram extintas com mais de 3000 raids (uma missão complicada, dado que as pessoas mais perto do chão nunca viram a luz do sol entrar), a maioria dos habitantes eram refugiados e viciados em droga, em contraste com a relativa ordem de 1948 até 1974, o período das Triades. Segundo a wikipedia:
The City was notorious for its excess of brothels, casinos, opium dens, cocaine
parlours, food courts serving dog meat, and secret factories. The Kowloon Walled City
was also infamous for its high number of unsanitary dentist clinics, since unlicensed
dentists could operate there without prosecution."

Hoje em dia, existe um parque na zona.

Tal como as outras fotografias que aqui disponibilizo, estas, numa resolução bem melhor, podem ser visionadas no meu flickr.
Foram tiradas numa viagem de dois dias ao Portugal profundo, ao concelho de Almeida, perto de Vilar Formoso. Se dez anos atrás ali viviam 40 mil pessoas, hoje em todo o concelho habitam apenas 8 mil, preferindo o litoral. O que mais choca nem é a pobreza, que pouco se vê. É o isolamento e o abandono. Aldeias como Castelo Mendo, Castelo Bom, Aldeia de São Sebastião e muitas outras, não têm rigorosamente nada à volta nem com que ambicionar. As aldeias estão em óptimo estado de conservação ao abrigo de um programa de recuperação de fachadas, que se tratou disso mesmo. Passando por elas à noite, vimos casas de pedra habitáveis, reduzidas no tamanho, mas às escuras pode dentro, sem ninguém que se fixe ali. No solar onde fiquei, pertencente aos donos da Pousada de Almeida, disseram-me que o plano não recuperou o interior das casas, continuando elas degradadas por dentro. Uma pena. No regresso passei também por Trancoso e pela belíssima aldeia de Moreira de Rei.



Em 1281 o rei D. Dinis concedeu Carta de Feira à povoação, ordenando que esta se realizasse 3 vezes por ano, a primeira a realizar-se com regularidade em Portugal. O nome da povoação deve-se ao primeiro alcaide, D. Mendo Mendes, nomeado por D. Dinis no séc. XIV, sendo possível distinguir numa das paredes da antiga Casa da Cadeia uma escultura em pedra que, segundo a tradição popular, representa o Mendo.
Numa outra casa próxima a representação da Menda, sendo por isso designada Casa da Menda, que seria a esposa de Mendo.
As casas em pedra desafiam o mundo moderno, ausente até na memória colectiva das simpáticas idosas que ainda habitam por Castelo Mendo. Os caminhos que daí saem, perdem-se por vales enormes, onde um desvio significa perdermo-nos (e encantarmo-nos por horas).

Castelo Bom tem um café. Muito vazio, quase só ao dispor dos visitantes da aldeia. Existe uma estrada bem antiga que liga Castelo Bom a Castelo Mendo, eu fi-la durante a noite e depois fiz questão de voltar lá no dia seguinte, recomendo.